sábado, 29 de novembro de 2008

Mais do novo.

Saudade de escrever, filho. E agora vem a reforma ortográfica. Acho que houve outra em 1971. Eu tinha um ano, então já fui alfabetizada de acordo com as novas regras. Com você vai ser igualzinho. A mamãe aqui é que vai ter que se alfabetizar de novo. Assim seja. O livro, o tempo, o vento, a chuva. Até a reforma veio em boa hora. Novo tempo, filho. Tempo de aprender e começar de novo.

quarta-feira, 26 de novembro de 2008

Mais uma vez, obrigada.

Um dia precisei gritar para o mundo o que eu sentia.
Ontem tive certeza: o mundo ouviu.

Muito, muito, muito obrigada.
A cada um que recebeu o blog e o livro de braços abertos.

sábado, 22 de novembro de 2008

Te vejo em São Paulo.


Muitas pessoas perguntam onde encontrar o livro para Francisco. Explico: o livro foi editado por um selo da Editora Saraiva, por isso ele pode ser encontrado atualmente, com certeza, nas livrarias da rede, virtuais e físicas. Mas a Saraiva é uma grande distribuidora, que cobre todo o Brasil. Então é só uma questão de tempo. Após o lançamento, o livro vai aos poucos sendo encomendado por cada livraria e pode ser encontrado em lojas de todo o país, virtuais e físicas, grandes e pequenas. Ele já pode ser encontrado, por exemplo, na Cultura, na Fnac e na Siciliano (que na verdade é da rede Saraiva). Se na sua livraria predileta você não encontrar o livro nos próximos dias, peça. Se eles ainda não tiverem feito sua encomenda, podem fazer um pedido na Editora Saraiva.

Algumas matérias legais que saíram sobre o lançamento do livro:

Ilustrada.

Jornal O Tempo.

Revista Paradoxo.

Monovolume.

quarta-feira, 19 de novembro de 2008

Linda.


Ela, sim, herdou uma dor maior que a minha. Ainda assim, me ligou no mesmo dia e disse com voz firme: "Não saia de perto, você é nossa". E assim se fez. Freqüento aquele sorriso todo fim de semana. E para nós, filho, ela abre os braços, além do sorriso. Não falha – mesmo ao falar dos sorrisos que a vida não lhe dá. Mas ontem a gente sorriu num abraço forte. Era alegria, sim. Alegria de amor.

(foto Elisa Mendes)

domingo, 16 de novembro de 2008

Para contar a história de uma história.

Sensibilidade é uma virtude. Depois da minha conversa com a Michele Borges da Costa, do jornal O Tempo, eu já esperava que a matéria seria bem escrita. Ainda assim, ela conseguiu me surpreender. O texto, as fotos, tudo. É uma alegria ver a nossa história contada com tanto cuidado.

quarta-feira, 12 de novembro de 2008

Belo Horizonte ou São Paulo? Você escolhe.



Não precisa de convite impresso. Só precisa ir. O livro estará à venda no local, à vista ou no Mastercard. Vou estar lá esperando. De braços abertos e caneta em punho.

Obrigada, leitor.

É incrível como a sua manifestação me faz crer que o livro tem para você um significado tão grande quanto tem para mim. A cada leitor do blog que acolheu o livro, muito obrigada. E que alegria saber de cada pessoa que gosta do livro, tanto esteticamente como em seu conteúdo. Quando eu digo que foi o trabalho mais amoroso que já fiz na vida, tenho que acrescentar que a Fabiana Medina, editora que cuidou pessoalmente do projeto, colocou todo o amor dela também. Só tenho a agradecer, de novo.

segunda-feira, 10 de novembro de 2008

Alguém como você.

Olha, filho. O pai da Renata morreu uma semana antes de ela nascer. Hoje ela já está adulta, mas sabe pouco sobre o pai. Olha a carta que ela escreveu pra ele.

sexta-feira, 7 de novembro de 2008

As coisas engraçadas da dor.

Existem aniversários que não merecem comemoração. Para mim, filho, hoje é uma data importante e triste. A vida da gente muda demais quando a gente se separa definitivamente da mãe.

Ainda assim, sempre me lembro de um caso engraçado do dia 7 de novembro de 1994. Mistérios que nos ajudam a seguir em frente.

Se a mim impressionava o fato de minha mãe ser enterrada no mesmo túmulo do pai, que ela não chegou a conhecer, merece destaque o caso dos coveiros tentando tirar uma planta que enraizou bem onde fica o túmulo, antes do enterro. Foi um primo quem assistiu à cena. Num determinado momento, um deles jogou para cima um objeto que parecia ser uma tampa de crânio e gritou: "Lá vai o côco!". Melhor foi o comentário do meu primo: "Acabei de conhecer meu avô", disse acompanhando o movimento do bizarro objeto.

Lidar com a dor diariamente faz com que ela não se pareça tanto com dor. Ou seria impossível ser coveiro. E muitos são, filho. Muitos não têm outra escolha.

Sete anos depois, no enterro do meu pai, lembro da Tia Telida deparando com uma caixinha de metal ao lado da cova aberta. "É o seu pessoal?", perguntou apontando para a caixa. Era. E estariam ali "reunidos" para que no túmulo coubesse mais gente da família. Por mais trágico que isso pareça, é a frase que fica na memória. E ao contar o caso, multiplico o riso.

Também me lembro dos próprios, seu avô e sua avó, fazendo graça em muitos momentos difíceis. Talvez tenha aprendido isso principalmente com meu pai — e agradeço.

Horas depois de constatar a morte do seu pai, eu me lembro de chegar em casa e comentar com os amigos: "Já posso dar um depoimento em Páginas da Vida". É que eu e seu pai assistíamos a uma novela da Globo em cujos capítulos havia sempre, ao final, um depoimento de alguém que tinha passado por algo muito, muito difícil. Como imaginar que meses depois eu estaria em situação tão absurda quanto as que eu via com ele na TV. No mesmo dia, eu me lembro de ter dito também: "Pois não é que ele arrumou um jeito de não ter que trocar fralda de cocô?" Nem eu me reconheci ao ser capaz de fazer graça naquele momento. Mas que outra escolha eu tinha?

Lembro também da sugestão de um amigo diante da minha indignação: reclamar com Deus algo do tipo "Por favor, me chama o seu gerente!". Ouvir isso, de certa forma, ajudava a aceitar minha frustração. A piada do meu amigo era só a prova de que ele havia conseguido se imaginar no meu lugar.

Nem um mês depois, o chá de bebê foi para mim o primeiro grande confronto entre alegria e tristeza. Era ainda muito recente a ida do seu pai mas, ao mesmo tempo, era dia de festa: não podíamos deixar de comemorar a sua chegada. Mas foi impossível não notar que quase todas as pessoas chegavam com um pacote de fraldas ultra-mega-max reforçado — o que na verdade era uma grande vontade de trazer seu pai de volta. Cadito, grande amigo do seu pai, não se contentou em trazer apenas fraldas. Incluíu no pacote algodão, escova de cabelo, luvinha pra limpar os futuros dentinhos, forro para o trocador e outros mimos de que não me lembro mais. Naquela enorme sacola tinha uma vontade de me colocar no colo, filho. E não foi preciso ele me dizer isso.

Outro dia me lembrei de outro personagem da nossa história: o salmão. Nos últimos dois meses da minha gravidez, era ele o cardápio escolhido pelos amigos que chegavam em casa, amorosos, levando os ingredientes para o almoço. Isso se repetiu por umas três ou quatro vezes, variando os amigos, mas nunca o salmão. O que é lindo, não fosse o fato de eu não gostar de salmão. Comia, sorridente. Porque a delicadeza do gesto era o grande tempero. Poucos daqueles amigos souberam depois sobre a minha não-afinidade com o tal peixe. Mesmo porque, ao longo do tempo acabei por achá-lo um peixinho até gente boa.

O amor é cor de salmão, filho. E o humor é a lente suave a impedir que a realidade ofusque os nossos olhos.

Talvez por isso eu insista em trazer comigo lembranças engraçadas dos dias mais difíceis da minha vida, aqueles em que eu estava diante da perspectiva de um longo período de tristeza.

Rir não é alegria nem tristeza. Gargalhada não é sorriso. É um respiro no meio de tudo, um respiro muito bem pensado. Talvez para tomar fôlego e continuar o caminho.

Comigo acontece sempre: estou sentada à mesa e bato o joelho sem querer no tampo ou num dos pés do móvel. A dor é tamanha que começo a gargalhar. E a dor chega a não parecer dor.

Já reparou, filho? Acho que ainda não. Mas você ainda vai aprender, Francisco. E vai me ensinar muito também.

sábado, 1 de novembro de 2008

A chuva.

Quando os primeiros pingos caíram, naquela tarde de sábado, você olhou para o céu admirado: "A fuuuuuuva!"

Isso faz uma ou duas semanas.

Num desses dias você aprendeu o que é trovão, observando os raios e a água caindo, com um olhar de respeito, como se soubesse da sua pequeneza diante dela. Sua voz ficava até mais suave na hora da exclamação.

Essa noite ela veio de novo. Dias e dias de um calor abafado e assustador e o prenúncio da sua chegada é um vento forte que nos faz fechar todas as janelas e suportar a alta temperatura dentro do apartamento.

Eu tinha acabado de me deitar quando ouvi você dizer baixinho "A suva, a suva." Fui até o seu berço e não resisti aos seus braços pedindo que eu o tirasse de lá. Depois de uma semana de trabalho duro, a saudade fala mais alto.

E eu só tinha me entregado à cama por saber que não agüentava mais. Mas ao ver você minha exaustão dissolveu feito pó. Só importava abraçar e dizer: "Estou aqui".

Fiz um embalo com o corpo, você deitado no meu ombro como de costume, quando a chuva de fato começou. E um relâmpago assustador acendeu o céu por um instante, seguido de seu som que, você vai aprender um dia, sempre chega mais tarde. Foi um estrondo, filho. Um que me pegou de surpresa. Meu corpo estremeceu, abraçado junto ao seu, e tive medo de assustar você com o meu próprio medo.

"Tuvão, tuvão", você repetia, pequenino.

Disfarcei, respirei fundo, recobrei a serenidade como num piscar. Nessas horas, não importam as coisas que me amedrontam, nem os colos que me faltam. Visto uma armadura de não-sei-o-quê, engulo o tremor e calo a minha ingenuidade. Aperto você junto ao meu corpo como se quisesse voltar a colocá-lo dentro de mim. Sou seu porto-seguro porque assim tem que ser.

Foi então que eu, pequena e uma só, cresci mais uma vez para acolher você com a força de um mundo.